terça-feira, 29 de novembro de 2011

MST perde Egídio Brunetto,companheiro de todas as frentes de batalha

É com um sentimento profundo de tristeza e de grande dor, que informamos a perda do companheiro Egídio Brunetto, dirigente do MST que atuava no Mato Grosso do Sul, em um acidente de carro no interior do estado, ocorrido na tarde de hoje, quando ele se dirigia ao assentamento Itamaraty.
Egídio é foi um ser humano muito especial. Filho de camponeses sem terra, trabalhou desde a infancia na roça, e sempre muito esperto e indignado, envolveu-se com a pastoral da terra na regiao de Xanxere-SC e se transformou em militante do MST desde a década de 80. Desde então, contribuiu com a organização do Movimento em todo o país e com as lutas dos trabalhadores rurais pela terra, pela Reforma Agrária e por transformações sociais.
Militante exemplar, preocupava-se sempre com os cuidados de cada militante, e foi uma pessoa generosa e solidaria com todos. E aplicou isso empunhando a bandeira do internacionalismo e da solidariedade às luta dos povos e da classe trabalhadora, responsável pela relação do Movimento com organizações camponesas na América Latina e no mundo, sendo fundador da Via Campesina Internacional.
O MST e o povo brasileiro perdem um grande companheiro e um ser humano exemplar. Egídio, um guerreiro Sem Terra que andou pelo mundo, construindo a aliança do Movimento com a classe trabalhadora, deixou muitos e belos exemplos de vida, que pelo menos nos motivarão a segui-lo.
Sao paulo, 28 de novembro de 2011
Com muita dor,
Direção Nacional do MST

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Portal DESACATO forma a 1ª Cooperativa de Produção em Comunicação e Cultura no Estado de Santa Catarina


Desde 25 de agosto de 2007, data histórica do Uruguai, aqui na terra fértil do Contestado e da Novembrada, um grupo pequeno de camaradas, cansados das sucessivas genuflexões dos partidos políticos da esquerda frente ao Império e ao capitalismo, do autoritarismo dos grupos de gabinete, decidimos reorientar o rumo e nos encaminhamos à luta informativa de contracorrente. Tali Feld Gleiser (nascida em Santiago do Chile), Vanessa Bortucan (nascida em São Paulo), Juan Berterretche (nascido em Rivera,– Uruguai), Marco Arenhart (nascido no Rio Grande do Sul), e Raul Fitipaldi (nascido em Montevidéu,– Uruguai), os três de fora, portenhos (de Buenos Aires) de coração, iniciaram o caminho sem muita imaginação, nem sequer sem saber se teria sentido a tarefa iniciada. Os parceiros que permitiram e animaram isto: Thiago Skarnio de Alquimídia e as fraternas cumpas de Pobres & Nojentas, Elaine, Mimi e Rô.

(Lembramos com carinho a participação inicial de Elisa Veras, Carlos Raulino Jr., Jacky Gleicel e Douglas Maçaneiro.)

Hoje, 4 anos depois, com milhares de artigos e imagens publicados, com grandes colaboradores no Brasil e no exterior, com uma linha antiimperialista e anticapitalista sem claudicações, com milhares de leitores, esse pequeno grupo se transforma na 1ª Cooperativa de Comunicação e Cultura, que com sede em Florianópolis, SC, Brasil, a partir de sua fundação, em 9 de dezembro próximo, pretende dar sustentabilidade, capacidade e idoneidade à ferramenta criada, e reunir a Informação e a Cultura na condição de instrumentos da Formação e a Mobilização Social na busca de Outro Mundo Possível e Urgente.


A beleza não é só para os ricos

Por Elaine Tavares – jornalista

Florianópolis é uma cidade que vive da beleza. Esse é o principal “produto” que seus governantes põem à venda para atrair milhares de turistas em todas as temporadas de verão. Não é sem razão que ano após ano as gentes veem subir dezenas de prédios e hotéis, destinados a abrigar aqueles que vêm para a ilha em busca da beleza. E assim, tal qual Hípias na Grécia antiga, os agentes de turismo vendem a beleza de Florianópolis como coisa. “A praia bela, a areia bela, a paisagem bela, a comida bela”. Mas, quem nasceu aqui ou os que aprenderam a amar a cidade como um espaço onde se vive a vida cotidiana, a beleza tem outro sentido. Não é coisa, é ser. Assim, para esses, o que é belo não é a praia, a areia, a paisagem ou a comida, mas sim a ideia que comunica o caráter das coisas. E se beleza é ideia, não pode ser objetivada, nem vendida.

Ainda assim, o que acontece é que os que amam a cidade precisam conviver/com e batalhar contra com os vendilhões capitalistas, os que apenas enxergam a coisa a ser vendida, sem se preocupar com aqueles que vivem e sofrem a cidade no dia-a-dia. Vai daí que aparecem os conflitos.

Um deles acontece bem agora, nesses dias de quase verão. De novo, os vendilhões decidiram atacar mais um espaço de beleza da cidade, transformá-lo em coisa e vendê-lo aos que também só conseguem conceber a beleza como um objeto. A ponta do Coral. Esse lugar é uma pequena ponta de terra que avança sobre a Baia da Beira Mar, isolada da cidade pela via-expressa e os arranha-céus. Ali, desde os anos 80, os movimentos sociais, estudantes e militantes de toda a ordem vêm lutando para que seja construído um parque e um espaço de atividades culturais. Ou seja, é a proposta da beleza democratizada, entregue a toda cidade. Uma coisa muito justa uma vez que o aterro da Baia é hoje o espaço de moradia da classe alta, que acabou privatizando a vista, a terra e tudo mais.

Pois não satisfeitos com isso, agora as forças do capital querem se apropriar da Ponta do Coral, lugar que historicamente pertenceu aos pescadores, às gentes simples da cidade. O projeto das empreiteiras – tendo a frente a empresas Hantei, é fazer um aterro, descaracterizando completamente o lugar, e construir ali uma marina para que os iates e barcos de turismo possam atracar. Também propõem, no lugar do centro cultural público – como é desejo dos movimentos – construir um hotel de luxo. Será o Parque Marina Hotel.

Hoje a Ponta do Coral é espaço conflagrado, uma vez que a cidade luta há décadas para que aqueles 14 mil metros quadrados, onde vive uma fauna exuberante (garça-branca, biguá, baiacu, garça-azul, socó-dorminhoco, bem-te-vi, quero-quero) possa ser utilizado pela comunidade, de forma livre e democrática. Ninguém aceita a conversa de que aquela é uma área privada e que, portanto, o dono pode fazer o que quiser. Não é assim. A propriedade também deve cumprir uma função pública.

A Ponta do Coral, por ser um terreno à beira-mar, deveria ser terreno de marinha, embora conste em documentos que o dono é Realdo Guglielme, empresário de Criciúma. No passado esse terreno pertenceu a Standart Oil Company que ali tinha um depósito, o qual as entidades queriam ver tombado para a concretização da proposta de um casarão cultural. Com a construção do aterro da Beira Mar (nos anos 80), o Estado acabou comprando o lugar e, depois, com a via expressa concluída, a ponta ficou afastada do resto da cidade e foi vendida outra vez. Mas, a população queria preservar o lugar como área verde e fez um grande movimento. Tudo isso foi em vão. A Ponta do Coral seguiu em mãos privadas e logo já apareceu o projeto da construção de um hotel. Houve manifestações, protestos, luta, mas, como quem manda na cidade é o dinheiro, em 1998 Guglielme conseguiu derrubar o prédio da Standart Oil e frustrar uma luta de anos. Ainda assim, os movimentos sociais seguiram lutando e inviabilizando a construção do hotel.

Agora, a queda de braço é com a construtora Hantei, contratada para levar adiante a proposta do hotel e da marina. A Ponta do Coral, velho espaço de pescadores e área de lazer do povo da Agronômica é coisa vendável, é paisagem/objeto, é privilégio para poucos. Na cidade, os movimentos que se levantam contra o empreendimento são tratados como os “inimigos do progresso” ou os “do contra”, como é comum aos capachos do poder tentar ridicularizar e diminuir aqueles que pensam no bem público. O fato é que o “progresso” que a marina e o hotel se propõem a trazer não será para todos. Apenas os donos do empreendimento se encherão de dinheiro com a proposta. O que as empresas envolvidas no processo dizem é que o povo de Florianópolis vai ganhar porque haverá muitos empregos. Outra bobagem. Os empregos que um empreendimento como esse geram podem ser gerados em outros lugares e o serão, uma vez que a vocação da ilha é o turismo. Assim, a vida de nenhuma pessoa será inviabilizada se o projeto não vingar. Pelo contrário. Com um parque cultural, toda a gente da cidade poderá se favorecer e desfrutar de qualidade de vida.

A compra das consciências e as ilegalidades

Como sempre acontece em situações como essas, a empresa construtora iniciou um trabalho de compra de consciências. Contando (ou comprando?) com o apoio de grandes empresas de comunicação a empresa fez um agressivo trabalho de relações públicas, afirmando que a Ponta do Coral não será um espaço privado. Será construído o hotel de luxo e a marina, mas o povo poderá disfrutar de uma série de equipamentos públicos como pracinha para crianças, anfiteatro e praça. O que a empresa não diz é que esse espaço público ficará de cara para a rua, ou seja, completamente desprovido da beleza do lugar. As pessoas terão um lugar, mas ele será de segunda categoria. A beleza da ponta ficará de uso exclusivo dos turistas, hóspedes e navegadores. Para os empresários da construção “a plebe” deve ficar satisfeita com esse acordo e pegar o que pode.

Não bastasse esse engodo de “espaço público”, a empresa ainda anda pela comunidade espalhando a promessa de emprego, o que não deixa de ser algo tremendamente cruel, uma vez que é óbvio que não haverá empregos para todos, e os oferecidos não passarão dos cargos de arrumadeira, garçom ou, quem sabe, de atracadores de barco. E, as gentes, premidas pelas necessidades da vida, acabam embarcando nessa conversa furada.

Isso ficou patente na última audiência pública que aconteceu no dia 22 de novembro, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. A Hantei, buscando criar falsa uma empatia junto aos deputados convocou moradores da Agronômica, empregados da construtora e até das imobiliárias para se manifestarem favoravelmente ao projeto. E o povo lotou a sala. Mas, para surpresa de todos, três horas depois do início da audiência foi descoberta a razão de tanta gente. A maioria havia recebido dinheiro para comparecer. As mulheres levaram 15 reais e os homens 20. Boa parte das pessoas não sabia absolutamente nada do que estava acontecendo ali, apenas seguiam as instruções para bater palma ou se manifestar quando alguém mandasse. Tiveram até direito a um lanche. O blogueiro Mosquito conseguiu a gravação da fala de um grupo de mulheres e denunciou a trama.

A audiência acabou sendo uma rica experiência de desvendamento de máscaras, como bem lembra Loureci Ribeiro, um dos estudantes que participou dos primeiros atos em defesa da Ponta do Coral e que, hoje, como arquiteto, segue defendendo a proposta comunitária. Poucos políticos da cidade compareceram (nenhum vereador), mostrando o quão pouco se importam com os assuntos da comunidade. E o que se viu foi o claro conluio que existe entre os grandes empreendimentos, a mídia, a administração municipal e os órgãos ambientais para o loteamento geral da cidade da beleza.

Além dos movimentos sociais que historicamente tem lutado contra o projeto de privatização da beleza da Ponta do Coral, apenas a voz solitária da representante do Ministério do Planejamento, Isolde Espíndola, se fez ouvir, dizendo que a lei 180/2005 – que doa 12 mil metros de terra para a Hantei e permite o aterro de mais 30 mil – é ilegal e precisa ser anulada. “A área onde será feita o aterro é federal. A câmara de vereadores não tem ingerência. Essa é uma lei ilegal”. Mas, ainda assim, foi ignorada.

Enfim, a audiência cumpriu seu papel, expôs as feridas, as ilegalidades, as irresponsabilidades e os desejos obscuros das empreiteiras e dos maus políticos. Agora, é hora de a cidade se posicionar. Mas, essa posição precisa ser precedida do conhecimento. Ninguém pode acusar os movimentos sociais de ser “do contra”, sem saber antes contra o quê eles estão.
Nesse caso, os militantes sociais estão contra a apropriação indevida da beleza da Ponta do Coral por um pequeno grupo de empresários. O que os movimentos sociais querem é que aquele seja um lugar de todos, com todo o seu esplendor de flora e fauna, e não apenas uma praça perdida no meio do asfalto. A Ponta do Coral é um pequeno trecho de terra que avança na baia e que condensa uma vida rica e farta. É um lugar de beleza, de simplicidade, de ternura. É um vestígio isolado da velha cidade que foi cedendo passo aos arranha-céus, ao asfalto, aos espaços privados e elitizados. E por isso mesmo deve ser preservada como um patrimônio das gentes, de todos.

Agora, a luta segue, e precisa se encarnar na vida de todas as pessoas que amam de verdade essa cidade “perdida no mar”. Todo o esforço deve ser empreendido para a anulação da lei que entrega a ponta para a Hantei. E lá, naquele ínfimo espaço de pura beleza deve nascer o Parque há tanto tempo sonhado. Porque é direito do povo desfrutar da beleza que essa ilha tem. E que venham muito mais daqueles que são contra o progresso dos bandidos/grileiros do mar e da beleza.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

LHS: história de ferocidade contra as leis ambientais

EM DEFESA DA PROTEÇÃO DAS FLORESTAS E DA VIDA

Míriam Santini de Abreu - jornalista

Quem é Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), o agora senador e relator do projeto do novo Código Florestal nas comissões de Agricultura (CRA) e Ciência e Tecnologia (CCT) do Senado

LHS: história de ferocidade contra as leis ambientais

Foi na prefeitura de Joinville, entre 1997 e 2002, que o ex-governador e agora senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB) começou a fazer discurso e articular nacionalmente o que viria a ser o “Pacto Federativo como instrumento de Desenvolvimento Sustentável com a União”.
Quando prefeito da maior cidade do Estado, LHS – como é mencionado na imprensa estadual - tinha embates frequentes com os órgãos ambientais por causa das irregularidades que a prefeitura avalizava. Em 1997, o Ibama embargou uma obra e o operador de uma máquina chegou a ser levado para depoimento na Polícia Federal. Irritado, o prefeito Luiz Henrique da Silveira chegou a ameaçar enviar os fiscais do Ibama para o Piauí. Veja a história em http://www1.an.com.br/1999/jun/22/0cid.htm
Ali é mencionada a Empreiteira Fortunato, que fazia uma série de obras para a prefeitura (http://www.fortunato.com.br/pt/home/)
LHS chegou a governador e começou a articular, no novo cargo, a sua estratégia em nível nacional. Trazia a SC empresários de outros países para conhecer as “potencialidades” do Estado. Seus relacionamentos empresariais incluem o empresário Fernando Marcondes de Mattos, dono do badalado Costão do Santinho, no norte da Ilha, que LHS convidou para jantar, num gesto de solidariedade, no dia em que Marcondes foi solto da cadeia após ser preso na chamada Operação Moeda Verde. Saiba mais em:
Sua relação com o empresariado pode ser vista na página do TRE, onde aparecem os doadores declarados de sua campanha, um deles o empresário Eike Batista, que tinha planos, frustrados pela mobilização popular, de construir um estaleiro no Estado. Veja os doadores em:
O episódio da instalação do estaleiro planejado pelo empresário Eike Batista escancarou que, em Florianópolis e em SC, há um “nós” - parte expressiva do meio político e empresarial - e os “eles” – movimentos e organizações críticos e boa parte da população -, divisão que claramente se identifica nos conflitos na cidade e no estado.
Como prefeito e governador, LHS ficou conhecido, pelos movimentos e organizações, como crítico feroz de quem quer que se colocasse em seu caminho. Sabe-se claramente de que lado ele está. É conhecido, no estado, o trecho de uma entrevista que ele concedeu a uma emissora de televisão sobre, entre outros temas, a questão ambiental.
Vale a pena relembrar um caso exemplar, a instalação de um empreendimento empresarial turístico (campo de golfe) no badalado balneário de Ingleses, em Florianópolis, também por iniciativa do empresário Fernando Marcondes de Mattos. Próximo ao empreendimento mencionado há uma comunidade, a Vila do Arvoredo, também conhecida como Favela do Siri, que começou a se formar nos anos 1980. No embate travado para a instalação do campo de golfe, é ilustrativo o conjunto de comentários feitos pelo então governador do Estado, Luiz Henrique da Silveira, na já mencionada entrevista concedida à emissora de televisão em abril de 2007, na qual há 17 minutos referentes à temática ambiental. Ver em http://video.google.com/videoplay?docid=-8286208201407673708#
Nela o governador Luiz Henrique da Silveira menciona o assunto (1), quando questionado sobre a reclamação dos empresários em relação à “burocracia” e a “dureza” das leis ambientais. Diz ele:
1- Eu acho que nós vamos ultrapassar esse período negro, que não é possível que nós não possamos ter em uma ilha como essa, maravilhosa, certo, marinas para receber turistas estrangeiros com muito dinheiro que venham gastar aqui e gerar emprego. Que nós não consigamos fazer um campo de golfe, meu deus do céu. Em Marbela, você viu, tem 50 campos de golfe e por isso aquela vila pobres de pescadores foi transformada num dos maiores pólos milionários de turismo. Então nós precisamos ter uma evolução. O que as pessoas têm que ter em mente é que uma marina não polui. Nós vimos lá em Marbela, dentro da marina, a profusão de peixes que havia. Pelo contrário, ela desenvolve, ela embeleza. Ela traz um novo dinamismo para as cidades. Então nós temos que superar isso, estamos com um grave problema, eu vou dizer aqui especialmente para os florianopolitanos [...].
No trecho seguinte (2), o governador classifica de “medievalismo” a posição do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em relação às licenças ambientais e diz que é preciso descentralizar as decisões relativas às políticas de meio ambiente:
2 - Quem sabe cuidar mais de Florianópolis é o florianopolitano. É a Prefeitura, é o vereador. Quem sabe cuidar mais do meio ambiente do estado é o Governo do Estado, são os deputados estaduais. Então é preciso acabar com essa burrocracia [com dois erres na pronúncia] em que dois ou três técnicos lá em Brasília, longe da realidade, decidem as coisas, ou não decidem, porque um monte de processo, uma montoeira de processo não lhes dá tempo nem de examinar os processos.
Um dos apresentadores pergunta então se não é necessário haver controle em relação a isso, porque a natureza estaria “dando resposta” às ações humanas, ao que o governador questiona (3):
3 - E agora você me diz: e a favela do Siri, ali? Do lado do campo de golfe que não querem deixar o Fernando Marcondes [de Mattos, empresário] fazer? Por que não se proíbe a proliferação de favelas, que joga - me permita a expressão irada - cocô para a praia para provocar doenças nas nossas crianças? Por que não se atua nisso aí para impedir? Né? Por que não se atua nisso aí para impedir? A favela pode poluir a praia. Agora, um resort, um hotel, um campo de golfe, para atrair turista e gerar emprego e renda não pode.
Do ponto de vista discursivo, evidencia-se, na fala do governador, uma série de indícios que apontam para diferentes sujeitos sociais: “não querem deixar (...) fazer” (quem?); “nossas crianças” (quais?); “por que não se atua (...)” (quem?). No trecho 2, ele deixa explícitos, porém, os sujeitos sociais que seriam os mais capacitados para “cuidar” do “meio ambiente” do estado. E no trecho 1 está sinalizado o exemplo da “evolução”, o balneário de Marbella, na Costa do Sol, Espanha, totalmente descaracterizado pela especulação imobiliária estimulada pela corrupção (ver em http://ises-do-brasil.blogspot.com/2007/08/operao-moeda-verde-verso-espanha.html.
Não é por acaso que LHS é o relator do Código Florestal. Ele iniciou, em SC, uma prévia local do que agora ocorre no âmbito nacional. Por aqui entrou com Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o SNUC.
O mandato do então governador Luiz Henrique da Silveira foi de 2003 a 2006, e sua reeleição de 2007 a 2010. O projeto do Código Ambiental de SC foi uma das bases das promessas da campanha de reeleição em 2006. Como LHS foi reeleito, nos anos seguintes ele elaborou e aprovou o Código como promessa de campanha assinada no “Pacto Federativo como instrumento de Desenvolvimento Sustentável com a União”, texto disponível em www.fetaesc.org.br/comissoes/meioambiente/agenda.doc e assinado, em sua maioria, por representantes do Governo do Estado. O documento diz, em sua conclusão: “O Estado de Santa Catarina deverá negociar o “Pacto Federativo como instrumento de desenvolvimento sustentável” com a União, assumindo a Gestão Ambiental dentro de suas fronteiras territoriais, implantando o Zoneamento Econômico Ecológico e Zoneamento Econômico Ecológico Pesqueiro e elaborando o seu Código Ambiental fundamentado na Estrutura Fundiária do Estado e suas peculiaridades regionais”.

Veja como isso ocorreu, na prática, no resumo cronológico a seguir:

- Em 2001 foi apresentado um Projeto de Lei de um Código Ambiental em Santa Catarina, elaborado pelo deputado Francisco de Assis, que foi arquivado em 2005.
- Em 2006, o governo estadual recebeu a “Proposta de Agenda Ambiental para o Setor Produtivo do Estado de Santa Catarina”, que recomendava a elaboração de um Código Ambiental fundamentado na Estrutura Fundiária do Estado e suas peculiaridades regionais.
- Em fevereiro de 2007, o governador do Estado solicitou à FATMA – órgão ambiental estadual - coordenar a elaboração de um projeto de lei sobre o novo Código Ambiental de SC, feito com recursos do Programa de Proteção da Mata Atlântica (PPMA/SC).
- Em março de 2008, a FATMA entrega uma proposta ao governador. O texto elaborado pela FATMA é profundamente modificado pelo Executivo, que insere no mesmo as reivindicações presentes na “Proposta de Agenda Ambiental para o Setor Produtivo do Estado de Santa Catarina” elaborada em 2006.
- Em 24 de julho de 2008, o Governador encaminha para a Alesc a sua proposta do novo Código Ambiental (PL238/08). Durante a sua tramitação na Alesc, o PL238 passou pelas comissões temáticas e foi discutido em 10 audiências públicas no Estado: Lages, Campos Novos, Videira, Criciúma, Joinville, Blumenau, Rio do Sul, Chapecó, Concórdia e Florianópolis.
O formato das audiências foi criticado pela Federação das Entidades Ecologistas Catarinenses (FEEC), que afirmou que:
a) foram realizadas às pressas,
b) com parca publicidade, realizadas em dias úteis, em horários incompatíveis com a disponibilidade de pessoas,
c) não motivaram qualquer modificação no projeto de lei apresentado.
d) tiveram natureza meramente informativa.
e) foram apresentações parciais e direcionadas, blindadas às críticas, e serviram apenas para noticiar o projeto elaborado pelo Governo do Estado
- O projeto de lei foi aprovado pela Assembléia Legislativa do Estado e a Lei nº 14.675/09 foi sancionada pelo governador e publicada no Diário Oficial do Estado no dia 14 de abril deste ano.
O que predominou no texto aprovado da Lei estadual 14.675/09 foi o enfoque dado pelo Governo do Estado através da “Proposta de Agenda Ambiental para o Setor Produtivo do Estado de Santa Catarina”, cujas diretrizes foram consubstanciadas no “Pacto Federativo como instrumento de desenvolvimento sustentável com a União”.
A decisão do Governo do Estado e da maioria dos deputados estaduais da Alesc foi de acatar propostas de setores empresariais, desconsiderando o enfoque de outros importantes setores, tanto governamentais (FATMA e EPAGRI) como dos ambientalistas e de outras autoridades estaduais e federais, como o Ministério do Meio Ambiente ou o próprio Ministério Público Federal e Ministério Público em SC, que fizeram graves críticas quanto à legalidade e inconstitucionalidade do Código.
- Em 17 de abril de 2009, o Partido Verde ingressou no STF e no TJSC com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o Código Ambiental catarinense. No mesmo período o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e a Procuradoria da República em Santa Catarina protocolaram representação na Procuradoria Geral da República, pleiteando o ajuizamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o Código.
O então ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, também se manifestou publicamente pela imprensa contra o Código Ambiental, reascendendo o debate em torno da partilha constitucional da competência legislativa em matéria ambiental.
- Em 14/04/2009, o então governador contestou Minc e declarou, em entrevista:
Eu não tenho dúvida, esse código nacional vai cair. E o Congresso Nacional haverá de proclamar a competência dos estados para fazer leis de qualquer caráter ambiental, de acordo com a sua realidade territorial”.
Veja a entrevista em:

É importante que todas as pessoas de todos os cantos do Brasil conheçam essa história, para que aquelas preocupadas com o direito à vida tenham mais subsídios para fazer a luta contra as mudanças no Código Florestal.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Audiência Pública em defesa de Florianópolis, da natureza e da população

Gostaria de informar a você e pedir seu apoio para duas frentes importantes e urgentes que no momento estão atuando na cidade:

- a defesa da Ponta do Coral, face ao mega projeto da Hantei no local, que é APP (promontório), zona de amortecimento da ESEC Carijós e do Parque Municipal do Manguezal do Itacorubi;

- a recém criada seção catarinense do Comitê em Defesa das Florestas, contrário às alterações do Código Florestal Brasileiro, que, entre tantas, destituirá os Manguezais, berçários de vida marinha, da condição de APP (Área de Preservação Permanente), o que nos afeta diretamente.

Estas frentes estão sendo organizadas pela Câmara de Meio Ambiente do Fórum da Cidade, entre outras entidades, e nos reunimos às sextas-feiras, às 18 horas, na FAED do centro, ao lado do Corpo de Bombeiros.

Necessitamos de topo o apoio possível, pois, sem pressão popular, nada se consegue. A mobilização está sendo bem precária na cidade. Desde o Plano Diretor Participativo, dos 400 mil moradores, vemos apenas 20, 30 pessoas, que se disponibilizam a se reunir para discutir estas questões de extrema relevância para a saúde da população e das próximas gerações.

Portanto,

Estamos convidando você a participar nesta próxima terça feira dia 22 de novembro, da Audiência Pública na Assembléia Legislativa, as 19h, para debater a Lei 180/2005 e a Defesa da Ponta do Coral como área Pública e Coletiva.

Seguem textos explicativos e pranchas com fotos da nossa proposta. Acesse o blog Parque Cultural das 3 Pontas:

http://parqueculturaldas3pontas.wordpress.com e assine o abaixo-assinado!

PELAS FLORESTAS, assine o abaixo-assinado em: http://www.florestafazadiferenca.org.br

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Uma longa noite espanhola ou a primavera?

Elaine Tavares

A crise econômica e social está apenas começando

O que a mídia brasileira chama de movimento de indignados, na Espanha significa outra coisa. É certo que há muita gente indignada e que aproveita as manifestações para dizer a sua palavra, mas o movimento em si surgiu de lutas muito concretas que existem na Espanha desde há muito tempo. Uma delas é a luta das famílias que compraram suas casas e que, com a crise financeira e monetária já não conseguem mais pagar suas dívidas com os bancos. Essa gente, além de perder as casas, ainda fica obrigada a terminar de pagar a hipoteca que contraiu. Por isso, bem antes do 15 de maio, quando a Praça do Sol virou um símbolo da luta popular, o qual acabou dando nome ao movimento que segue até hoje, essa gente já andava por aí reivindicando, fazendo marchas e realizando ocupações nos bancos.

Não bastasse essa demanda muito concreta com relação às dívidas hipotecárias, havia também, já bastante organizado, o movimento “Juventude sem futuro”, que teve seu começo nas universidades. Os jovens, observando as mudanças que estavam ocorrendo no país, foram percebendo que ao contrário da geração passada, que viveu algum tipo de bem estar, não teriam a mesma sorte. Não havia moradia, nem saúde, nem educação, não havia futuro. A isso agregaram que se não havia futuro, tampouco haveria medo e desde aí saíram a lutar. Da mesma forma, estavam por aí organizados os anarquistas, comunistas, gente que trabalha com o movimento ecológico, com cooperativas de produção e consumo, enfim, uma série de movimentos sociais organizados que sempre estiveram reivindicando trasnformações.

Com as grandes movimentações populares que estavam alterando a vida no mundo árabe, muita gente que andava calada decidiu que poderia ser hora de expressar toda a sua indignação por coisas pontuais que vão desde temas históricos como a questão da república, até o movimento de pais pela guarda compartilhada. Ou ainda desde a liberação da maconha até a luta pelo fim do capitalismo. Então, de repente, pelas ruas estavam aqueles que nunca antes tinha tido coragem de se manifestar. “Nós que andamos nisso há anos ficávamos maravilhados quando saímos numa marcha e lá estava muita gente que não conhecíamos. Porque sempre éramos os mesmos. Depois do 15 de maio, juntaram-se milhares. Isso foi e continua sendo incrível”, diz Erika, do movimento ecológico.

O 15M, como ficou conhecido o movimento, não tem donos. As ruas estão aí para serem ocupadas e as pessoas reivindicam o que querem. Claro que os movimentos que já vêm organizados de longa data, ou os partidos políticos e sindicatos fortes acabam de alguma forma assumindo um protagonismo, porque estão nisso há muito mais tempo. São afinal os que permanecem nas assembléias, os que propõem e elaboram documentos, os que organizam as assembléias nos bairros. Mas, ainda assim, existem muitas pessoas que não estavam ligadas a nenhum movimento e que agora estão envolvidas até a medula no 15M.

A grande mobilização que só cresceu depois da repressão policial no 15 de maio, junto a Praça do Sol, acabou também criando um acampamento na praça, ao estilo do que já havia acontecido em Tunis e no Egito. Mas, por conta da tremenda logística que tinha de ser montada, a proposta do acampamento foi sendo revista. Hoje, pelo menos em Madrid, já não há mais acampamento, mas o movimento segue nas ruas, realizando marchas periódicas e principalmente nos bairros, onde também se organiza semanalmente com assembléias abertas e sistemáticas. Isso acaba sendo mais eficaz dado que as pessoas podem ter sua vida normal de trabalho e de vida, sem deixar de lado a organização. Julia tem 25 anos, uma filha pequena que exige cuidados, mas não deixa de estar nas manifestações, embora não esteja vinculada a nenhum movimento tradicional. “Estão acontecendo muitas demissões, o governo segue cortando verbas nas políticas sociais como, por exemplo, na de cuidados com as crianças, e a maioria acaba nem sabendo que isso acontece. Por isso viemos para as ruas. Para denunciar e barrar esses cortes de verba e de gente”.

Já os que estão na luta organizada há mais tempo e têm propostas muito claras de transformação do sistema, esse ainda é um momento muito pouco claro, embora cheio de beleza e de esperança. É o que diz Luis Nieto, da organização Paz con Dignidad. “As coisas estão acontecendo de forma muito rápida. Não sabemos onde vai dar. Estamos caminhando e discutindo as coisas, mas não sabemos se isso desembocará numa mudança de sistema ou de modelo de desenvolvimento”. Segundo ele, a Espanha está agora pagando pelos acordos espúrios dos anos 70, na política de transição da ditadura à democracia, que acabou cooptando muita gente, levando o pessoal de esquerda a se retirar do cenário. Agora, o povo está de novo se levantando. Os mais velhos estão de volta na luta, há gente muito jovem querendo mudanças. “Um ano atrás não havia esse movimento, tínhamos muito pouca gente no processo de luta. Hoje temos tudo isso, essa organização, a juventude. Penso que se daqui a um ano ficarem 30% desse povo na luta, já será muito bom para começar um processo de transformação nesse país”.

A Espanha está vivendo um clima pré-eleitoral, de eleições para presidência. Mas, nas ruas, o povo que anda a fazer a luta tem uma coisa bem clara: essa gente não os representa. O PP (Partido Popular) é a velha direita, o PSOE (Partido Socialista Obrero Español) há muito tempo que renegou o socialismo fazendo com que essa palavra perca todo o significado por aqui. E esses são os dois gigantes que estão dividindo as pesquisas, e que acabam sendo muito parecidos na sua forma de atuar. Há outros partidos menores, de esquerda e de direita, mas com muito pouca representatividade. Nas ruas, a voz corrente é a do voto nulo embora os militantes mais organizados, que atuam nos sindicatos ou movimentos sociais sejam mais inclinados ao voto na IU (Izquierda Unida uma coalizão de vários pequenos partidos de esquerda). “De qualquer forma sabemos que nessas eleições ainda não lograremos fazer frente ao sistema”, dizem. O mais provável é que ganhe o PP.

E assim segue a gente de Espanha, cheia de esperança de que algo aconteça pela força da sua mobilização. Como dizem todos, é uma incógnita o que pode acontecer. O certo é que a crise por aqui tende a se aprofundar com cortes no serviço público, desemprego, corte nas políticas sociais, dívidas externas elevadas, enfim, uma realidade que para nós, latino-americanos é muito conhecida, mas que para os europeus mais jovens, que não viveram os duros anos do pós-guerra, se afigura como uma grande tragédia, porque é o fim do chamado estado de bem estar. Nos corredores do poder, novo países da periferia européia, como é o caso de Espanha e Portugal, devem ser a bola da vez, já que a Grécia e a Itália estão aparentemente dominados. Assim, por certo, muita luta ainda deve ser travada por aqui.

PIQUENIQUE NA PONTA DO CORAL

15 de nov - terça feira - 17h

PIQUENIQUE NA PONTA DO CORAL

Objetivo: reunir/confraternizar/fazer faixas e cartazes/mobilizar


18 de nov - sexta feira - 17 às 19h

PANFLETAÇO na frente da Ponta do Coral

Objetivo: Mobilizar e divulgar a Audiência Pública com panfletos, faixas, cartazes e abaixo-assinado


19 de nov - sábado - 10 às 12h

PANFLETAÇO na ESQUINA DEMOCRÁTICA

Calçadão da Felipe Schmidt com Deodoro

Objetivo: Mobilizar e divulgar a Audiência Pública com panfletos, faixas, cartazes e abaixo-assinado


21 de nov - segunda - 17 às 19h

PANFLETAÇO na ESQUINA DEMOCRÁTICA

Calçadão da Felipe Schmidt com Deodoro

Objetivo: Mobilizar e divulgar Audiência Pública com panfletos, faixas, cartazes e abaixo-assinado


22 de nov - terça feira- 19h

Audiência Pública
Tema: Histórico de Uso e Ocupação, propriedade e zoneamento da área da Ponta do Coral
ALESC - Auditório Antonieta de Barros

Fonte: CÂMARA DE MEIO AMBIENTE E SANEAMENTO DO FÓRUM DA CIDADE - CMAS-FC

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Comitê Brasil/SC em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável foi lançado no dia 9 em Florianópolis

A Câmara de Meio Ambiente e Saneamento do Fórum da Cidade, em conjunto com o Cominter, Coletivo UC da Ilha, Instituto CarbonoBrasil, UFECO e Sala Verde, lançaram no dia 9 de novembro a seção catarinense do Comitê Brasil em Defesa das Florestas e Desenvolvimento Sustentável.

Estabelecido em 7 de junho de 2011, o Comitê Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável é uma coalizão formada por 163 organizações da sociedade civil brasileira contrárias ao PLC 30/2011 aprovado pela Câmara dos Deputados e agora em tramitação no Senado.

O lançamento foi na Assembléia Legislativa de SC, visando mobilizar e sensibilizar a população sobre a dilapidação da legislação nacional que atualmente protege as florestas e fomenta o desenvolvimento sustentável. Esteve presente o representante do Comitê gaúcho, José Romari Dutra da Fonseca, que falou sobre o trabalho realizado no estado vizinho.

O objetivo é mobilizar a sociedade catarinense para pressionar os deputados e senadores na votação do Código Florestal em defesa dos seguintes princípios:

1-Garantia efetiva da conservação e uso sustentável das florestas em todos os biomas brasileiros

2-Tratamento de forma diferenciada e digna dos agricultores familiares e populações tradicionais;

3-Garantia de recuperação florestal das áreas ilegalmente desmatadas;

4-Reconhecimento e valorização de quem promove o uso sustentável;

5-Controle público para evitar desastres ambientais e garantia de água de boa qualidade para as cidades;

6-Ação pública rigorosa pelo fim do desmatamento ilegal.

Mais informações: www.comiteflorestas.org.br & www.sosflorestas.com.br

Veja entrevista com Cid Neto, do Coletivo UC da Ilha, no dia 9 de novembro de 2011 em Florianópolis

http://www.youtube.com/watch?v=6xx1XB_oTWw

Veja fotos do lançamento do Comitê Brasil/SC





Crédito: Míriam Santini de Abreu

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Vencendo as ciganas

Elaine Tavares

Ali estava eu, extasiada diante da mesquita, em pleno centro de Córdoba. Foi quando chegaram as ciganas. Lindas como só elas sabem ser, com seus cabelos negros e dentes de ouro. Cercaram-me com a algaravia que lhes é peculiar. “A ver la suerte niña”. Disse que não, e que, ao contrário, eu lhes poderia ver a sorte. Sorriram, apontando para o bindi que tenho no meio da testa. Uma delas me entregou um galho de alguma planta dizendo que era para dar proteção. Aceitei.


Outra logo foi me pegando na mão e ainda que eu dissesse que não queria saber do futuro ela foi dizendo coisas acerca do que iria me acontecer. Já não adiantava mais. Eu estava pega na armadilha. Não haveria mais como escapar. Essa é a tática milenar.


Eu conheci os ciganos quando criança, pois em minha cidade natal havia muitos. E ficavam sempre num terreno perto de casa. Era impossível ignorá-los. Para nós, que éramos crianças, parecia um mundo tão misterioso o daquela gente, vivendo nas tendas. As mulheres com seus vestidos coloridos, a música tocada com violinos e os bailes ao redor da fogueira. Coisa mágica. Os adultos diziam para termos cuidado que eles eram ladrões de crianças, mas era impossível não sucumbir diante daquele universo tão diferente do nosso. Ali ficávamos, extasiados. Aprendi com eles que é uma obrigação das mulheres andar a ver a sorte e então, desde aí, sempre paro e dou atenção. Respeito demais essa tradição e esse povo.


Mas, nessa fria manhã em Córdoba, a simpática cigana me enganou. Após ler a sorte pediu um trocado. Fui buscar uma moeda. Não aceitou dizendo que moedas traziam má sorte. Tinha que ser dinheiro de papel. “Só tenho 20 euros”, expliquei. Disse que trocaria. Aceitei. Então, quando lhe passei a nota dizendo que lhe daria de bom grado 5 euros, ela agradeceu e disse que era aquilo ali mesmo. Não haveria troco. Zanguei-me. “Tu estás me roubando”. Ela riu, “Seriam 40 euros, uma para cada mão”. E ficou ali um bate-boca que, sabia, não resolveria o problema.


Foi então que decidi apelar para os meus poderes. Tirei os óculos escuros e pedi que me olhasse bem dentro dos olhos. Ela olhou, as demais companheiras acompanhando, sorridentes. Haviam pegado uma trouxa. E eu, tomando-lhe a mão disse, muito séria, os olhos grudados nela: “Eu te respeitei e tu me enganaste. Vou te jogar agora uma maldição. Em menos de dois dias uma tragédia muito grande vai se abater sobre ti e tua família. Ojo, nena, ojo”. Ela sustentou meu olhar e estremeceu.


As demais deram um passo atrás. “Es bruja, es bruja”... murmurou, atarantada. E, olhando para as amigas disparou: “dame cambio, dame cambio”... Não tinham.

Ela, ainda sob a força daquela maldição me disse, “venha, venha, vou trocar o dinheiro”. E se foi, como louca a pedir a um e outro comerciante que trocasse os 20 euros. Voltou e me passou os 15 euros. “Retira a maldição, retira a maldição”, pediu. Eu então disse a ela: “nunca mais engane alguém que está te respeitando como eu estava”. Ela assentiu e parecia que o que mais queria era se ver livre de mim. Peguei meu troco, retirei a maldição e sai. As ciganas ficaram a murmurar. Estavam realmente assustadas. Eu me fui pela rua, sorrindo. Foi uma coisa mágica. Em plena capital do antigo mundo árabe, eu vencia cinco ciganas nas artes do sortilégio e do engano.


Por primeira vez convenci-me de que de fato, sou bruxa. Naquela mesma hora, no meio da praça quase deserta, tocaram os sinos. Coloquei meus óculos escuros e segui, poderosa...

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A Globo se protege

Por Elaine Tavares - jornalista
Tem certos assuntos que dão uma preguiça. Um deles, pelo menos para mim, é a rede Globo. Empresa nascida no período militar, abençoada pela Time Life, veio para criar a idéia de um “estado nacional”, sob o ponto de vista dos militares, é claro. Depois, ao longo da sua vida como empresa, sempre de braços dados com o poder. Não importa qual seja. E, nesses anos todos, o jornalismo que pratica é o que interessa aos donos do poder. Ou seja, no mais das vezes, nem jornalismo é. Propaganda, como bem diz Noam Chomsky. É certo que, vez ou outra, um determinado repórter escapa dessa lógica e consegue produzir jornalismo de qualidade, mas é raro. O que também às vezes ocorre é que, como ensinou Adelmo Genro, alguns fatos por si mesmo são tão eloqüentes que transcendem qualquer possibilidade de manipulação. Mas, o que é certo é que o jornalismo global é porta-voz do poder. Não se importa com a vida das gentes, essa gente real, que luta e protesta.
Assim, não pode causar espanto que existam por aí afora pessoas que sintam vontade de repudiar com mais veemência essa prática nefasta de mau jornalismo. Há os que fazem análises ácidas, mas se comportam de forma respeitosa. Há os que escracham, os que xingam, os que são bem deselegantes. Mas há também os que chutam o balde mesmo. Talvez porque tenham aprendido que no Brasil tentar fazer as coisas “por dentro da ordem” não dá muito resultado. Por isso, por aí andam esses que fazem aparições nos momentos em que os repórteres globais estão ao vivo.
Outro dia acabaram derrubando uma repórter e o caso virou notícia nacional através das redes sociais. Enfastiada, acabei lendo bastante coisa que saiu e não me surpreendeu que a maioria dos comentários fosse de repúdio aos manifestantes. Alguns chegaram a dizer que era um ataque ao jornalismo. Bueno, ainda com preguiça, resolvi entrar no assunto.
Lembrei de uma campanha salarial que fizemos em Santa Catarina na qual se desencadeou a “operação papagaio de pirata”. Nela, alguns colegas se postavam atrás dos repórteres da RBS que entrassem ao vivo, protestando, com cartazes, sobre os baixos salários no estado. Foi um momento histórico da luta dos jornalistas em Santa Catarina, até hoje lembrado com orgulho. Não era um ataque ao “jornalismo”, mas um ousado e criativo protesto contra a rede que mais explorava jornalistas naqueles dias. E não foram poucos os que condenaram a eficaz forma de luta dos jornalistas, alguns apelando para o que chamavam de “desrespeito aos colegas”. Ora, não era. Pelo contrário. Era amor pelos companheiros explorados.
Assim, vejo esses ataques que andam acontecendo junto aos repórteres da Globo como um saudável protesto contra os péssimo serviços da emissora. E, finalmente, um protesto que se pode ver, justamente pela radicalidade do grupo. Não os comparo com vândalos ou baderneiros. Devem ser criaturas que querem ser escutadas e encontraram nessa forma a mais eficaz. E vejo que tem dado certo.
Talvez isso leve os big boss da Globo a pensar um pouco sobre o que andam fazendo. Que tipo de jornalismo é esse que, num país democrático, precisa de segurança para se fazer? Não seria isso um sintoma claro de que algo está podre no reino da platinada? Perguntas que qualquer profissional sério se faria. Mas, qual! A primeira resposta da Globo foi, pasmem, demitir os trabalhadores que faziam a segurança da equipe. E a segunda atitude foi anunciar que agora os repórteres que entrarem ao vivo serão cercados por um aparato de proteção contra vândalos. Interessante isso! Mais uma trincheira impedindo a verdade de entrar.
Eu, aqui da periferia da periferia, no sul do sul, não tenho dúvidas. Esse povoa aí não está agredindo as pessoas, nem o jornalismo. Estão protestando contra a mentira, a manipulação e ao descaso com a vida real. E quer saber? Gosto disso!