quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Quando bate o vento sul

Elaine Tavares
O meu Campeche fica doido em dias de vento sul, tal como hoje, nessa terça-feira luminosa. Pelas ruas de areia, nada se segura. Voam os cabelos, as roupas nos varais, as telhas, as cadeiras do quintal. Caem os limões maduros, os mamões. Tudo fica agitado, como se fosse o prenúncio de um fim de mundo. Os cachorros uivam, um lamento estranho, como se comunicassem com forças invisíveis. Lá longe ruge o mar, onde as criaturas sagradas vivem. As ondas se agigantam e aconselham a não sair de canoa.

Quando vem a noite tudo fica ainda mais assustador. As corujas não voejam, escondem-se sabe lá onde. Não há vagalumes e os gatos ensaiam pulos endoidecidos. “Têm visagens”, dizem os antigos. Arrepios. Os sinos de ventos ficam numa dança louca e o seu tilintar avisa que é tempo de sossegar. As cortinas dançam por conta das rajadas que ultrapassam as gretas da madeira. As portas pipocam.

Essas são as noites em que as bruxas da ilha saem ao vento a fazer estripulias. Por isso as coisas batem e trocam de lugar. Dizem que se a gente andar pela rua escura sem algo cobrindo a cabeça, elas montam no vivente e aí, é um deus nos acuda. Pode até ser que a pessoa não consiga chegar a casa. Todo cuidado é pouco nestes dias de ventania.

É por isso que agora, quando a barra do dia já caiu, eu espio pela porta e me aquieto, chimarreando. Rodeada por gatos, cachorros e gentes, só me resta aprontar a sopa e contar histórias. Estas lindas histórias dos tempos de antanho.

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