segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O povo resiste, luta e vencerá em Honduras!

Nas primeiras décadas século XVI, quando no imenso território que hoje é o Brasil os colonizadores começavam e explorar o pau brasil para ocupar o território, na América Central a colonização espanhola seguia acelerada, dizimando povos nativos, “empunhando uma espada e uma cruz na outra mão”. Numa das regiões que hoje é o território hondurenho, os desde então chamados indígenas resistiram com mais força, liderados por Lempira. Este foi traído e morto em combate, mas deixou rastros na cultura e na ideologia do povo mestiçado nos quase cinco séculos seguintes. A moeda de Honduras chama-se Lempira, uma cínica homenagem burguesa ao herói indígena.
Mas na alma profunda do povo mestiço, ficou a mensagem: o povo não se renderá, embora continue sendo traído, agora por modernos gestores dos monopólios, a maioria dos quais de origem estadunidense.
Desde o dia 28 de junho tem manifestações todos os dias nas principais cidades de Honduras, especialmente na capital, Tegucigalpa. É assim mesmo, todos os dias, sem que ninguém faça um panfleto sequer de convocação, reúnem-se e protestam aos milhares. Nos dias de convocação, são trinta ou cinqüenta mil pessoas na capital e em San Pedro Sula, a cidade industrial.
Os gorilas (e nenhum outro nome lhes cabe tão bem) realizaram um golpe preventivo, seqüestrando o presidente, no dia 28 de junho, justamente para que os trabalhadores e o povo pobre não começassem a tomar gosto pela soberania popular e pelos direitos elementares. Manuel Zelaya tinha aumentado os salários, distribuído terras, rurais e urbanas, entrou na ALBA, e, gota d´água, convocara um referendum com o objetivo de eleger uma assembléia constituinte.
Erraram nos cálculos os golpistas, pois o povo já começara a gostar de transformações, e não saíram mais das ruas. Não deram um único dia de trégua aos usurpadores.
Com o retorno de Zelaya, no dia 21 de setembro, indo pedir proteção justamente na embaixada brasileira, a euforia popular se multiplicou por cem. Esse plano foi inteligentíssimo, pois o Brasil é um país respeitado por lá, e força o governo brasileiro a girar à esquerda na sua política internacional. Se Zelaya fosse para a embaixada da Venezuela, não haveria tanta repercussão internacional, e os gorilas poderiam com mais facilidade invadi-la. Se fosse para a embaixada dos Estados Unidos, ela não seria invadida, mas a saída diplomática seria pela direita. Desde que se espalhou a notícia da presença de presidente legítimo, Honduras deixou de ser um país em “transe” e agora é um país em ebulição. Não tem mais jeito, a menos que liquidem multidões pela força. Os golpistas perderão!
Reprimem violentamente, e isso enfurece mais os manifestantes, radicalizando os ânimos. Decretam toque de recolher, e, pelo tempo de duração, acabam indignando também a parte da população que está indecisa, pois começa a haver uma crise de abastecimento. Suspendem o toque de recolher, e centenas de milhares aparecem em marcha, no centro da capital. Reprimem com mais violência, e instigam revoltas sempre mais fortes. Agora, às 17:00h locais (20:00h de Brasília) lançam o estado de sítio, para reprimir mais…
Não se despreze o fato de que estão matando gente, neste momento. Se o governo golpista reconhece uma morte entre os manifestantes, é porque já devem ser dezenas. Realizam prisões em massa, e precisam usar estádios como prisões, lembrando o Chile de 1973. Como ainda podem falar em democracia?!? Rádios e canais de televisão independentes fora do ar, aeroportos fechados, inclusive para impedir a presença de organismos internacionais. Uma ditadura no sentido mais exato da palavra.
E os filhos de Lempira não param de ir às ruas, e já perderam o medo até mesmo de morrer. “Nos tienen miedo porque no tenemos miedo” cantam diante dos repressores, e é verdade, porque já não temem nada. E os gorilas atacam porque todo gorila tem medo de povo na rua. Senhoras idosas, senhores de cabelo brancos, meninos, muitos jovens, todos vão às ruas. Regressando quinhentos anos na ideologia, a espada e a cruz estão juntas no combate ao povo mestiço do século XXI, assim como estavam juntas no século XVI massacrando e “reduzindo” os descendentes do povo maya. O bispo chefe da igreja católica também é gorila, desde o primeiro dia do golpe, muito embora padres católicos estejam com a resistência, assim como os evangélicos, os umbandistas e os antigos credos indígenas remanescentes.
O povo vencerá em Honduras, e isso é questão apenas de tempo e de forma. Se ainda nesta data as forças de repressão estão massacrando o povo, esse jogo vira, e em pouco tempo os organismos internacionais terão que ir garantir a vida dos gorilas. A menos que algum país abasteça de armas e munições as forças da repressão (e Israel já mandou tecnologia e instrutores de massacre) em algum momento o exército e a polícia terão que recuar, como já esboçam fazer nas escaramuças dos bairros.
A luta do povo hondurenho é nossa luta! Honduras de 2009 não pode ser a Guatemala de 1953, ou seja, o limiar de uma onda de golpes militares por todo o continente. A vitória do povo hondurenho será a nossa vitória, pois avançarão lá em soberania popular, espalhando exemplo, e os gorilas de todo o continente, inclusive os daqui, terão que pensar muito mais antes de cometer desatinos.
O governo brasileiro precisa jogar duro na ONU, e exigir uma decisão de fechamento do cerco sobre os golpistas, forçando-os a fugir enquanto têm tempo, e levando-os aos tribunais internacionais para que paguem por seus crimes. Ou o mundo vai esperar a continuidade do massacre, que pode se intensificar muito quando acabarem as munições não letais e usarem apenas as outras. Já que o povo hondurenho venceu, é preciso que os governos e os organismos multilaterais parem de fazer cena e ocupem espaço para evitar que em poucas horas os golpistas matem milhares de pessoas. Em Honduras reside parte significativa da direita mais reacionária e dos algozes mais sanguinários de todo o continente, e o mundo não pode desprezar esse elemento. Eles podem matar muita gente em poucas horas, num derradeiro suspiro de vilania.
Avante filhos de Lempira, ao pescoço dos gorilas!

Florianópolis, Santa Catarina – Brasil, 23 de setembro de 2009.
Amauri Soares
Deputado Estadual

Nenhum comentário: