segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Ódio, mas não santo

Míriam Santini de Abreu, jornalista

Escrevo a propósito de dois comentários feitos em duas diferentes postagens no blog da revista Pobres & Nojentas, um referente a Che Guevara e outro ao resultado do referendo na Venezuela, abaixo. Nos dois comentários, espantei-me com o tom virulento das palavras, escritas em maiúscula, como se quisessem se transmitir aos berros. Cheias de um certo ódio, mas não o “majestoso, santo, puro e benfazejo” ódio do poeta Cruz e Sousa. Só ódio.
Cita o Anônimo, num dos comentários, um certo “modelo de democracia respeitada no mundo inteiro”, referindo-se à democracia brasileira, que estaria “sempre se ajustando com o passar do tempo”. Bem, o que me interessa no comentário é essa idéia de democracia, porque me espanta o ódio provocado, em certos grupos sociais e em certos espíritos, por figuras como Guevara e Hugo Chávez.
Num outro comentário, mais um Anônimo faz algumas afirmações sobre Guevara, cuja biografia conheço porque sobre ele li – não a feita pela revista Veja – que também revelam esse ódio sem adjetivos.
Em ambos, parece estar colocada essa idéia de que “os outros fazem o que eu sou incapaz de fazer” ou “os outros não fazem o que sou capaz de fazer”. E tanto num quanto noutro comentário, ressoa também uma análise social que vê na ausência de guerra a ausência de conflito. No comentário sobre a Venezuela, a idéia de democracia é reduzida a uma suposta liberdade de poder falar e pensar. Falar e pensar a partir de quê? Da revista Veja?
Fala o autor do “respeito às diferenças” na democracia brasileira. Sim, existem, mas a partir de um determinado patamar social, bem estreito. Dele para baixo, de tal respeito não há nem sombra. Desse patamar para baixo, onde os degraus são largos e onde está a maioria, mulheres ficam presas com homens, pessoas morrem em filas de hospital, crianças são largadas no lixo. Gente – no dizer de Nietzsche – fatigada até para morrer. Fatos que rendem – alguns – notícias durante uma semana, até que, mantidos os fatos, sejam substituídos os nomes. Democracia da desgraça. Respeito à diferenças, sim, porque, diferentemente do pobre, o nome do rico não freqüenta essas seções dos noticiários. E, sim, isso se ajusta com o passar do tempo no Brasil, porque, cada vez mais, a sociedade em geral se interessa cada vez menos em “falar e pensar” sobre a distância que separa esses dois patamares.
Há mil maneiras de matar, o fuzil de Guevara foi uma delas. As outras 999 são o cotidiano na maior parte das cidades brasileiras, latinas, do mundo, onde vive a parcela para a qual essa “liberdade de poder falar e pensar” não se manifesta. Pela qual poucas bocas gritam. Pela qual não há letras maiúsculas a berrar a injustiça.Não fosse assim, eu não leria nas páginas da grande mídia nessa semana coisas como “Imprensa mundial estampa derrota de Hugo Chávez”. Refestelam-se na derrota.
Penso nisso a propósito do livro “Fábrica de mentiras”, do jornalista alemão Günter Wallraff, que revela o processo de fabricação de notícias do jornal Bild. Wallraff cita trechos em que a empresa proprietária do Bild analisa o papel social do veículo:

O Bild é também um remédio contra o tédio e ajuda a pessoa, segundo sua própria capacidade, a lidar com o mundo que a cerca de uma maneira sensata.

E mais adiante:

A necessidade dos leitores do Bild de um mundo ordenado, um mundo que pode ser visto e compreendido – um mundo que ele procura e encontra no Bild -, inclui também a angústia diante deste mundo impossível de se compreender sem ajuda. Essa angústia do leitor é captada pelo Bild de muitas maneiras... Graças à autoridade do jornal, o leitor livra-se de ter que procurar, por conta própria, ordenar, tornar visível e julgar o que acontece no mundo a seu redor. Como o jornal Bild fornece a seus leitores uma visão ordenada e comentada do que ocorre no mundo – de maneira curta, concisa e decisiva - , eles têm plena certeza de que, apesar de tudo, vêem e compreendem este mundo.


Sem desejar entrar aqui em análises mais minuciosas, de viés mais político, penso que, em certos discursos individuais como os comentários citados – mas amostras de um certo coletivo – o gesto de agarrar-se à idéia de democracia sem perceber a realidade em volta tem muito de medo. Esse medo imemorial que ronda a nossa alma, medo da perda, medo de saber que nunca se está tão alto que não se possa cair, e que nunca se está tão baixo que não se possa levantar. Ninguém – desde que esteja com o espírito apaziguado – deseja cair. E poucos lá no alto se permitem a idéia de que os caídos desejem se levantar, da forma que for, seja ela socialmente aceita ou não. Em nossa sociedade, a idéia de “subir”, “ascender”, é diariamente acalentada na mídia, mas não pode ser um movimento coletivo. É sempre individual, para recompensar alguém por sua “capacidade”, seu “empreendedorismo”, um currículo feito de forma correta, uma certa “qualificação”. A tevê e os jornais estão cheios de notícias desse tipo, fáceis de compreender. Não há que se pensar em ascensões coletivas, porque essas necessariamente exigem chacoalhões na sociedade, na forma de pensar, de agir, na política, enfim. Na tal democracia.
E assim o máximo a que muitos se permitem na suposta vida democrática é essa difusa “liberdade de poder falar e pensar”. Sim, para eles Veja é indispensável.

4 comentários:

Anônimo disse...

Míriam, teu texto é duro feito o diamante e suave igual a flor do pessegueiro.

Li em teu texto algo do meu amado Nietzsche. Dele eu tenho esta terrível frase:
"O homem, no fundo, é apenas malvado, mas a mulher é ruína".

Mais esta: "Uma imagem dorme na pedra".

E daqui vai um parabéns porque o teu texto, Míriam, é um martelo na têmpora dos basbaques.

Abraço

Fernando Karl

elaine tavares disse...

Querida companheira.. tuas palavras são sábias marretadas, como bem gostava nosso amado, controverso, contraditório e adorável Nietzsche.

Anônimo disse...

AS FAVAS OS INTELECTOALOIDES.........
AS FAVAS A UTOPIA.........
AS FAVAS O "MUNDO DA LUA"........
ACORDEMMMMM,ACORDEMMMM..........
VOCES ESTAO VIVENDO EM QUE MUNDO,ACODERDEM.........
VIVEM EM UM MUNDO CONSUMISTA, CAPITALISTA, DESDE O IMPERIO E VEM COM ESTA ONDA DE TUDO E MEU, TUDO E TEU, ACORDEM........
AQUI NAO TEM NINGUEM COM RAIVA, O QUE FOI SITADO NO COMENTARIO E QUE NINGUEM VAI ME TIRAR A MINHA LIBERDADE DE PENSAR, CONQUISTADAS A DURAS PENAS DE TANTA GENTE QUE MORREU POR ESTE PAIS DURANTE A DITADURA MILITAR, COMBATENDO OS CORRUPTOS DO PODER INSTITUIDOS NA EPOCA E AGORA QUE CONQUISTAMOS ALGUMA COISA, VEM VOCES ME DIZEREM QUE O MODELO PERFEITO E O QUE O PAIS "VISINHO"ESTA FAZENDO, SAI DESSA, E FURADA. ESPERO QUE O NOSSO PRESIDENTE ATUAL, TENHA REALMENTE MUITO DECERNIMENTO E NAO CAIA NESTA LOUCURA TAMBEM DE SE PROLONGAR NO "PODERRRR".
IMAGINA VEVERMOS COMO EM CUBA, COMO SE VIVE NA CHINA, COMO SE VIVE NA COREIA DO NORTE.
VAMOS PRIMAR PELA NOSSA LIBERDADE QUE JA TEMOS E DEVEMOS SIM E SEMPRE EXIGIR MAIS LIBERDADES MAS COM MUITA RESPONSABILIDADE.
OLHA TEM UMA COISA BEM INTEREÇANTE, QUE ACHO VOCES NAO SE DERAM CONTA, NOS DIAS DE HOJE, SO SE TEM ESTA LIBERDADE DE SE EXPRESSAR, POR CAUSA DA DEMOCRACIA QUE VOCES TANTO COMBATEM, SOU JORNALISTA CONHEÇO A FUNDO AS MAZELAS DAS REDAÇOES, SEI QUE UM FOCA SAI COM O RANÇO E A LAVAGEM CEREBRAL DOS PROFESSORES PTSAO, MAS QUANDO CHEGA NA REDAÇAO DE UM JORNAL MESMO QUE NAO DE BRINCADEIRINHA, CAI NA REAL O TA NA RUA, POIS O GURI VEM COM AS IDEIAS DE SALVAR O MUNDO E O SANTO AQUATRO E O PRIPRIETARIO DO VEICULO DE COMUNICAÇAO SO PENSA NO LUCRO QUE O ANUNCIANTE VAI LHE REPASSAR, VOCES ACHAM QUE O DONO DO JORNAL VAI DEIXAR PASSAR UM TEXTO QUE VAI CONTRA O SEU CLIENTE ? CLARO QUE NAO, E UTOPIA PENSAR DIFERENTE, TENTEM SALVAR O MUNDO DE OUTRA MANEIRA SEJAM MAIS INTELIGENTES, SEJAM MAIS OBJETIVOS E MAIS SUCINTOS, VIVAM A REALIDADE DO MUNDO QUE VIVEMOS....
CAI NA REAL O MUNDO E CAPITALISTA MESMO, OU VAI DIZER QUE VOCE NAO GOSTA DO QUE E BOM, UMA BOA COMIDA,UM BOM ALTOMOVEL NAO PRECISAR SE ULTIMO TIPO NEM DE LUXO MAS BOM, UMA BOA CASA QUE NAO PRECISE DIVIDIR COM NINGUEM ESTRANHO A VOCE, PODER VIAJAR DE VEZ ENQUANDO, E OUTRAS COISAS QUE VOCE JA DEVE TER PENSADO EM FAZER NA VIDA, MATERIALMENTE E CLARO.
E OUTRA COISA BEM INTERESANTE E ESTA ONDA DE RECLAMAREM DE GENTE QUE ANDA DE CARRO IMPORTADO NA CIDADE, OLHA, VOCE IMAGINE ASSIM, UM GAROTO COM MUITO ESFORÇO DE SEUS PAIS, QUE LUTARAM UMA VIDADE INTEIRA PARA DAR UMA BOA EDUCAÇAO PARA ELE, E A DURAS PENAS, POIS A VIDA QUE LEVAVAM NAO ERA NEM UM MAR DE ROSAS, TEM O ORGULHO DE VER SEU FILHO SE FORMAR E VER TODOS OS SEUS SONHOS REALIZADOS ATRAVEZ DA PROFISSAO QUE ELE ESCOLHEU PARA SI PARA SUPRIR SUAS NESSECIDADES DE SUA VIDA, RESOLVE UM DIA POR SEUS PROPRIOS ESFORÇOS, REALIZAR UM SONHO DE ADQUIRIR UM OTIMO ALTOMOVEL IMPORTADO, SABE AQUELE SONHO DE GURI PEQUENO QUE ACHA QUE NUNCA VAI CHEGAR LA, MAS QUANDO ADULTO VE QUE CONQUISTOU UM LUGAR PARA REALIZAR PEQUENOS SONHOS, AI DEPOIS CHEGA UM BANDO DE VAGABUNDO MACONHEIRO E FALTA ATE DE BANHO PARECE ATE UM BANDO DE MENDIGOS, DIZER QUE O GURI E METIDO, QUE UM BURGUEZINHO POR ISTO OU POR AQUILO TEMOS QUE DAR PAU NELE, VAO SE ENCHERGAR, VAO TRABALHAR, VAO ESTUDAR, VAO SER ALGUEM NA VIDA.....

Anônimo disse...

Alguém deve oferecer uma xícara com chá de alface para acalmar este guerrilheirinho de uma só palavra:
acordem
acordem
acordem
acordem

continuo dormindo pra não ler
tanta bobagem num só texto

Fernando Karl